No terreiro que acolhe vozes e histórias, cada canto e cantar reverbera como ladainha sagrada. E quem pisa nesse chão com verdade vira parte dele.
O mês de junho chegou com toda força ao Cacique de Ramos, e a temporada junina da roda de samba já mostrou que será de grandes festas e encontros emocionantes. Neste dia 1º, um domingo com programação intensa por toda a Zona Norte, o Cacique se manteve como um dos locais mais procurados e bem frequentados por décadas a fio — por isso, sua história é reconhecida como patrimônio da cidade e do Estado do Rio de Janeiro.
Convidados para o evento, os cantores Gutto Junior e Lurdes Maria foram acompanhados pelos músicos da casa, o grupo Caciqueando. Consagrado pela autenticidade de sua batucada, o grupo foi recentemente batizado com o selo que leva o nome de um dos grandes sucessos sonoros do bloco, em mais uma homenagem ao multiartista Noca da Portela — autor de obras emblemáticas do panteão musical brasileiro, uma delas embala os desfiles do Cacique.
Gutto Junior, veterano do samba, compositor e intérprete do gênero, subiu ao palco logo após o término da partida entre Flamengo e Fortaleza, válida pelo Campeonato Brasileiro e transmitida no supertelão da quadra. A iniciativa atende aos frequentadores que desejam aproveitar os eventos do Doce Refúgio sem perder nenhum lance. Gutto trouxe na bagagem o repertório que já se tornou sua marca.
Como em todos os domingos no Templo Sagrado do Samba, a corte carnavalesca do bloco se apresentou com graça e desenvoltura, inebriando o público com a beleza do espetáculo protagonizado pela Musa de Ouro Amanda Prestes, o Índio Caciqueano Bruno Barão e a princesa Bella Carrulo.
Durante os intervalos, crescia a expectativa de um grupo que foi ao Cacique especialmente para prestigiar a estreia da jovem sambista Lurdes Maria. A cantora, de apenas 19 anos, é mineira — e veio de lá para cá para realizar o sonho de pisar neste palco, que segue iluminando quem o respeita com amor ao samba autêntico. Lurdes não apenas cantou: encantou. Em cena, emocionou. E, diante do público, provou que está pronta para brilhar. No coração, uma certeza: é esta a estrada que quer trilhar.
A estreante foi recepcionada no Espaço Bira Presidente para a tradicional sessão de fotos com a Diretoria de Ouro. Lurdes Maria discursou com gratidão e foi aclamada pelos anfitriões. Emocionada, foi surpreendida com homenagens e acolhida pela Diretora-Geral do Cacique, Christian Kelly, que entregou à jovem artista um kit com os produtos oficiais do bloco.
Sua mãe, Maristela Mello, também fez questão de expressar sua emoção: “Quero, de público, agradecer a cada um de vocês por esta oportunidade dada à minha filha. Passamos por inúmeras dificuldades para chegar até aqui — e tudo valeu a pena. Vê-la realizando este sonho conforta o meu coração, o do pai dela e de todos que contribuíram para este momento que ficará marcado em nossas vidas. Peço a Deus e aos ancestrais que conduzam esta casa e a todos vocês, diretores, ao presidente Bira, com saúde e prosperidade.”
Além dos agradecimentos, Lurdes Maria — que está no terceiro ano de Direito — concedeu entrevista à Cacique TV, em parceria com o programa Na Levada do Samba. Entrevistada por Nayra Cezari, apresentadora da atração no canal e na Rede NGT, a cantora falou sobre sua trajetória artística e suas inspirações.
Fora do palco, o trabalho de bastidores também movimentou a sede da instituição com ações voltadas à estrutura e ao bem-estar do público.
A gestão de Márcio Nascimento tem recebido os cumprimentos por melhorias que já se fazem sentir. Há quinze dias, o palco praticável retomou o espírito dos tempos fundadores do Doce Refúgio. Neste domingo, foi a vez da nova rampa de acesso à área reservada — demanda antiga, finalmente atendida. Para o gestor, cada intervenção amplia as possibilidades de acolhimento e torna o Cacique um espaço cada vez mais próximo do público.
Encerrando mais um domingo, entre um samba e outro, a roda girou como gira o tempo: com reverência ao passado, olhos atentos ao presente e esperança acesa no futuro, neste caso, um futuro tão próximo que não dá tempo de sentir saudades. No próximo domingo tem mais samba no Doce Refúgio. Pois no Cacique de Ramos, o samba não acontece por acaso ou modismo: ele permanece.